segunda-feira, 13 de julho de 2020

Universo, vibrações e ondas: a radiação eletromagnética no nosso dia a dia


“Nada está parado; tudo se move; tudo vibra.” O CAIBALION


Quando falamos em radiação a primeira coisa que nos vem à cabeça são os acidentes radioativos e o famoso símbolo do trifólio ou o “trevo de três folhas” (ver figura abaixo). De fato, a radiação se tornou conhecida pela sua periculosidade e os infortúnios ocorridos ao longo do século XX, como o desastre da usina nuclear de Chernobyl e o acidente radiológico de Goiânia, onde pessoas foram contaminadas pelo césio-137.

Trifólio, símbolo internacional da radiação.
Fonte: Museu de Ciências Nucleares

O que muitas pessoas não sabem é que a radiação está presente das mais variadas formas no nosso dia a dia. Somos capazes de enxergar os objetos ao nosso redor, conectar nossos celulares ao wi-fi, aquecer nossos alimentos num forno de micro-ondas e de realizar diversas outras atividades graças à radiação, mais especificamente à radiação eletromagnética.

Quando falamos em radiação eletromagnética, estamos falando de ondas formadas pela combinação de um campo elétrico e de um campo magnético. Tais campos sofrem oscilações em planos perpendiculares (90°) entre si, conforme mostra a figura abaixo.

Representação de uma onda eletromagnética.
Observe que os campos elétrico e magnético são perpendiculares entre si.
Fonte: UFC Virtual - Universidade Federal do Ceará

Uma onda (ou radiação) eletromagnética é conhecida por ser capaz de se propagar no vácuo, diferentemente das ondas mecânicas, como as ondas na superfície da água. Existe ainda outro tipo de radiação que provém do desprendimento de subpartículas atômicas oriundas do núcleo do átomo, como a radiação alfa e a radiação beta. Essas radiações são altamente perigosas, mas apresentam menor poder de alcance, uma vez que as partículas são mais "pesadas", havendo maior chance de colisão com outras partículas ao longo do caminho.

Alguns tipos de radiação são conhecidos pelo poder de transformar átomos em íons em virtude do arrancamento de elétrons durante a colisão. Radiações desse tipo são também conhecidas como radiação ionizante. Os exemplos mais comuns incluem as partículas alfa, as partículas beta, os raios gama e os raios X.

Penetrabilidade de alguns tipos de radiação.
Fonte:  Eliezer de Moura Cardoso (CNEN)


Quanto à radiação eletromagnética, esta também pode ser de diferentes tipos, de acordo com a frequência de onda. Vale lembrar que a frequência corresponde ao número de oscilações que a onda realiza por segundo, sendo dada em hertz (Hz). 1 Hz equivale a 1 oscilação por segundo.

De acordo com a equação fundamental da ondulatória, podemos afirmar que a velocidade de propagação de uma onda equivale ao produto comprimento de onda x frequência. Matematicamente, temos:

v = λ . f

onde λ é o comprimento de onda em metros (m) e f é a frequência em hertz (Hz).

A velocidade na fórmula acima é dada em m/s.

Toda radiação eletromagnética apresenta a mesma velocidade e essa velocidade equivale àquela encontrada para a luz (uma forma de radiação eletromagnética), sendo de, aproximadamente, 3,0 x 108 m/s. Isso equivale a dizer que em 1 segundo a luz pode percorrer uma distância de cerca de 300.000 km!

Os diferentes tipos de radiação eletromagnética podem ser organizados de acordo com as diversas frequências e comprimentos de onda em um esquema conhecido como espectro eletromagnético (veja a figura abaixo).

Espectro eletromagnético.
Fonte: ResearchGate


Conforme provado pelo experimento do prisma de Newton, a luz branca é composta por diferentes cores (agrupadas de forma simples nas sete cores do arco-íris). Cada cor do arco-íris corresponde a uma onda luminosa com frequência específica. A cor que apresenta menor frequência é o vermelho. Já aquela que apresenta a frequência mais elevada é o violeta.

Fenômeno da dispersão da luz branca em um prisma.
Fonte: TK Designer


Ondas com frequência acima do violeta, como a radiação ultravioleta, não podem ser percebidas pelo nosso cérebro através da visão. De forma análoga, ondas com frequência abaixo do vermelho, como a radiação infravermelho, também não podem ser detectadas por meio de nossos olhos.

As ondas de rádio e as micro-ondas são conhecidas por apresentarem baixa frequência e elevado comprimento de onda. Para se ter ideia, se fôssemos capazes de visualizar uma micro-onda, a distância entre as cristas dessa onda seria de aproximadamente 10 cm. No caso das ondas de rádio, essas ondas poderiam apresentar um comprimento de onda da ordem de 1 m ou mais! Radiações de baixa frequência são conhecidas por “agitarem” os átomos e moléculas, causando o aquecimento de líquidos e superfícies de materiais sólidos. Ondas de baixa frequência também são utilizadas para investigação de vida fora da Terra, através de radiotelescópios.

Conjunto de radiotelescópios para estudos astronômicos.
Fonte: Caveman Chuck Coker
 

Na outra ponta do espectro temos os raios X e os raios gama, de alta frequência. Essas formas de radiação são perigosas aos seres vivos, pois podem causar alterações em moléculas do nosso corpo, incluindo nosso DNA. Em pequenas doses, os raios X podem ser utilizados para visualização de órgãos e tecidos internos, como ossos e pulmões.

Imagem da primeira radiografia, realizada em 1895.
Mão da esposa do descobridor dos raios X, Anna Bertha Röntgen.
Fonte: Raios Xis


É bom salientar que nem toda radiação é potencialmente perigosa, nociva ou cancerígena. As formas de radiação que oferecem maior periculosidade são aquelas que apresentam maiores frequências e baixos comprimentos de onda.

Alguns elementos químicos, como o rádio e o polônio, também liberam radiação, devendo ser manejados com cuidado em virtude de sua potencial periculosidade aos seres vivos. Contudo, é bom deixar claro que esses elementos não estão presentes em altas quantidades na crosta terrestre.

Nem sempre o homem soube que os elementos químicos poderiam trazer riscos à saúde em razão de sua radioatividade. Para se ter ideia, no início do século XX, após a Primeira Guerra Mundial, mulheres trabalhavam em fábricas de relógios utilizando rádio fosforescente, um produto altamente perigoso. Somente vinte anos mais tarde é que foram constatar os efeitos deletérios que esse elemento havia causado nos corpos dessas mulheres, as quais ficaram conhecidas como garotas radioativas. Esse fato deu origem a um livro conhecido como “The Radium Girls”, conforme destaca reportagem do jornal El País (link aqui).

Mulheres trabalhando em fábrica de relógios com material radioativo.
Fonte: Jornal El País


A própria pioneira nos estudos sobre elementos radioativos, madame Marie Curie, ganhadora de dois prêmios Nobel, teve sua vida abreviada em virtude de uma leucemia, possivelmente decorrente de sua constante exposição às fontes radioativas durante suas descobertas.

Madame Marie Curie, cientista e física polonesa.
Fonte: Revista Super Interessante


O que aprendemos com tudo isso?

Conforme se pôde constatar, dados os variados exemplos mencionados acima, estamos cercados por radiação. Se pudéssemos visualizar todas as ondas que nos cercam, iríamos nos deparar com um oceano delas! Nascemos expostos à radiação e vivemos graças a ela (a energia do Sol que chega até nós também é radiação!).

Por fim, podemos afirmar que sem a radiação eletromagnética não poderíamos desfrutar da vida como ela é. Somos capazes de reconhecer o mundo à nossa volta graças à radiação e é ela que nos proporciona formas eficazes de nos comunicarmos e de investigarmos a constituição da matéria. Da próxima vez que tiver a oportunidade de presenciar um relâmpago ou um arco-íris num belo dia de chuva, lembre-se de que o Universo também é onda, vibração e energia! 🌈🌩

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Fontes:

terça-feira, 30 de junho de 2020

Ciência dos materiais no dia a dia: a diferença entre vidros e cristais


Certa vez fui ao supermercado e me deparei com algumas taças aparentemente de vidro numa prateleira na seção dos artigos e utensílios domésticos. Porém, ao esmiuçar um pouco mais, pude ver que não se tratavam de taças comuns: eram taças de cristal! 


Taça de cristal preto Strauss/Oxford.
Imagem: Centro Comercial Tiradentes


A princípio (naquela época) pensei que as taças de cristal fossem feitas a partir do quartzo, que para mim era o mesmo que cristal. Porém, fiquei imaginando até que ponto seria possível fazer uma taça a partir de uma peça de quartzo no estado bruto e minha ideia mirabolante começou a fazer cada vez menos sentido.

Cristais de quartzo.
Imagem: Cristais Aquarius

Se você é daqueles que pensam que cristal é sinônimo apenas de quartzo, já pode ir se despedindo dessa ideia. 
 
Quando escrevo isso, quero deixar claro que qualquer material pode ser considerado cristal, desde que ele tenha um arranjo ordenado de átomos ou moléculas numa longa distância (na escala atômica). Esse arranjo deve acontecer de tal forma que exista um padrão de repetição que possa ser verificado numa pequena porção do material. Existem casos em que o material apresenta pequenos grãos cristalinos, como se fosse formado por minúsculos cristais. Trata-se de um material policristalino. No caso de o material ser inteiramente cristalino, fala-se em monocristal.

Sais como o cloreto de sódio (NaCl), por exemplo, são formados por cristais. É possível, inclusive, fazer cristais em casa! Nas imagens abaixo podemos ver pequenos cristais de sal formados a partir de uma solução saturada com cloreto de sódio onde adicionei cloreto de ferro III (FeCl3) para dar uma “corzinha” amarelada aos cristais.


Cristais de sal formados em solução saturada
de NaCl com presença de cloreto férrico.
Imagens do autor.
 
Grande parte dos metais e algumas cerâmicas são considerados materiais cristalinos. Outros materiais, como os polímeros, podem apresentar diferentes graus de cristalinidade. Exemplos famosos são o polietileno de alta densidade (PEAD) e o polietileno de baixa densidade (PEBD), sendo este último menos cristalino que o primeiro.

Os vidros, em geral, não são considerados materiais cristalinos, pois a disposição espacial dos átomos torna-se aleatória e desordenada ao considerarmos uma distância significativa na escala atômica. Por esse motivo, fala-se que o vidro é um material amorfo.

Então as taças de cristal não são feitas de cristal?

O termo taça de cristal, a rigor, não é correto. Como as taças são feitas a partir do vidro fundido, trata-se de um material amorfo. Quando desejamos aumentar o brilho, a resistência e a transparência do vidro, podemos adicionar certa quantidade de chumbo (Pb) ou titânio (Ti) ao material. Vidros desse tipo são chamados de cristais em virtude das suas características de resistência, brilho e transparência, parecidas com a de um cristal propriamente dito. Taças desse material são conhecidas pelo som típico (o famoso tintim) durante um brinde. Um dos motivos que as tornam tão charmosas e elegantes.

Fonte: